sábado, 30 de agosto de 2014




Limpei o pó
Pó que já foi vida
Vida que quero ter contigo
Contigo me sinto no céu
Céu o que temos por limite
Limite o que nos torna ilimitados
Ilimitados neste nosso sentir
Sentir com todos os poros do corpo
Corpo cheio de alma
Alma deste nosso viver
Viver contigo o meu sonho
Sonho partilhado a dois
Dois este número par
Par que formamos nós
Nós de amor eterno
Eterno será nosso pó.


Fazé Araújo

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Entenda quem Puder



Não deixes que te reprimam, mulher!
Tu sentes o mesmo desejo
que eles tomam para si, como lícito.
E chamam-nos prostitutas, por este facto...
não é agir como um animal,
nem buscar apenas sexo.
É amar com naturalidade.
Com a intensidade do encontro...
é mostrar o amor que sentimos.
É amor e é desejo.
mas jamais submissão
obrigação ou conforto
dos depravados
que apenas revelam a satisfação do instinto.
O que trazemos connosco é mais elevado,
mais forte que apenas pó, de almas submissas e limitadas.
Mulher, ergue a tua alma!
Fá-lo por ti e para honrar aquelas que já o fizeram antes.
Tu podes brilhar da mesma forma, ou mais ainda,
com o complemento perfeito.
Toma tu as rédeas
controla o teu coração:
como bombeia, ao palpitar no ritmo da ilusão.
É a fé que todos transportamos
colhida pela igreja injusta.
Tu não és menos, quando muito, igual...
....que entenda... quem possa entender.


Mariam Barid

Pérolas



Sinto-te mais completamente em noites de tempestade intensa
em que a calma do teu coração me abraça
e as nossas almas se fundem e submergem nas estrelas...

abraços aleatórios e beijos à deriva em mares mais profundos
em que o toque ardente dos teus olhos
contrasta com a suavidade das tuas mãos.

É nessas palavras silenciosas, expressas em acções
que reside toda a simplicidade do perfeito Amor,
sincronicidade divina enquanto me beijas a boca
e desvendo-te o meu corpo como pérolas de cetim vermelho...

SLL

Pão



Trigo feito sustento 
Espiga feita corpo 
Da terra para o fogo 
Forno intirnista 
No calor da chama 
Centelhas de existência 
Sustentável e infindável 
Farelos de paixão 
Viver esses instantes 
Como migalhas de pão 
Desta vida de amor 
Mais do que côdea 
Amolecida pelas lágrimas
Quero saborear 
O miolo 
Da essência!

Faze Araújo

terça-feira, 26 de agosto de 2014

A Palavra



...Tudo o que você quiser, sim senhor, mas são as palavras que cantam, que sobem e descem...
Prosterno-me diante delas... 
Amo-as, abraço-as, persigo-as, mordo-as, derreto-as... 
Amo tanto as palavras... 
As inesperadas... 
As que glutonamente se amontoam, se espreitam, até que de súbito caem... 
Vocábulos amados... 
Brilham como pedras de cores, saltam como irisados peixes, são espuma, fio, metal, orvalho... 
Persigo algumas palavras... São tão belas que quero pô-las a todas no meu poema... 
Agarro-as em voo, quando andam a adejar, e caço-as, limpo-as, descasco-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas... 
E então revolvo-as, agito-as, bebo-as, trago-as, trituro-as, alindo-as, liberto-as... 

Deixo-as como estalactites no meu poema, como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes das ondas... 
Tudo está na palavra... 

Uma ideia inteira altera-se porque uma palavra mudou de lugar, ou porque outra se sentou como um reizinho dentro de uma frase que não a esperava, nas que lhe obedeceu... 
Elas têm sombra, transparência, peso, penas, pêlos, têm de tudo quanto se lhes foi agregando de tanto rolar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto serem raízes... 
São antiquíssimas e recentíssimas... 
Vivem no féretro escondido e na flor que desponta... 
Que bom idioma o meu, que boa língua herdámos dos torvos conquistadores... 
Andavam a passo largo pelas tremendas cordilheiras, pelas Américas encrespadas, em busca de batatas, chouriços, feijões, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele voraz apetite que nunca mais se viu no mundo... 
Tudo engoliam, juntamente com as religiões, pirâmides, tribos, idolatrias iguais às que traziam nas grandes bolsas... 
Por onde passavam ficava arrasada a terra... 
Mas aos bárbaros caíam das-botas, das barbas, dos elmos, das ferraduras, como pedrinhas, as palavras luminosas que ficaram aqui, resplandecentes... o idioma. 

Ficámos a perder... 
Ficámos a ganhar... 
Levaram o ouro e deixaram-nos o ouro... 
Levaram tudo e deixaram-nos tudo... 
Deixaram-nos as palavras.

Pablo Neruda

Pensamentos



Nesta manhã cheira a orvalho e a terra húmida, sentem-se aqui e ali os aromas mais puros da vida...

Apenas as aves quebram o silêncio com as suas vozes musicais e maviosas... e saio para conversar com elas de um modo que apenas eu e elas conhecemos.

As nuvens, na sua eterna dança, movem-se lentamente e a brisa leva consigo as palavras do meu coração.

Nela te sopro um beijo e um afago. Onde quer que estejas, encontrar-te-à.

SLL

A Inveja não tem Passado



Ainda não tendes advertido, que a inveja faz grande diferença dos mortos aos vivos, e dos presentes aos passados?

Os olhos da inveja são como os do Sacerdote Heli, dos quais diz o Texto sagrado, que não podiam ver a luz do Templo, senão depois que se apagava: 
Oculi ejus caligaverant, nec poterat videre lucernam Dei, antequam extingueretur. 

Enquanto as luzes são vivas, cada reflexo delas é um raio, que cega os olhos da inveja: porém depois que elas se apagaram, e muito mais se se metem largos anos em meio, então abre a inveja, como ave nocturna, os olhos; então vê o que não podia ver: 
então venera e celebra essas mesmas luzes, e levanta sobre as Estrelas seus resplendores. 

Por isso disse com grande juízo S. Zeno Veronense, que todo o invejoso é inimigo dos presentes, e amigo dos passados: 
In omnibus se inimicum praesentium servat, amicum vero pereuntium. 

Os mesmos que agora amam, e veneram tanto (...), se viveram em seu tempo, o haviam de aborrecer e perseguir; e as mesmas maravilhas, que tanto celebram e encarecem, se foram obradas na sua Pátria, as haviam de escurecer e aniquilar.

António Vieira

Substância



Entre nós, não há palavras
nem promessas a manter
nem mentiras no que
hoje de noite murmuramos em surdina
apenas toques
suaves e macios
ternos e cálidos
doce rendição num singelo suspiro
início de combustão nas chamas do Amor Perfeito
que se consuma
e se estende além do mais infinito
brotam lágrimas na pura alegria
de tanta intensidade
como sabes que te sinto
além do tempo e do espaço
além de quaisquer fronteiras
além de qualquer corpo
além de ti
e de mim também....

SLL

Vida



Três votos fará aquele
que não ser tolo decida
e venha deles primeiro
o de obediência à vida

será o segundo a vir
o de não querer ser rico
o muito passe de largo
o pouco lhe apure o bico

não violar-se a si próprio
como principal o veja
alto ou baixo gordo ou magro
assim nasceu assim seja.

Agostinho da Silva

Sempre



Sê Luz, sê sombra
sê aquilo que for necessário
entrega-te ao Universo porque há muito a fazer...
fortalece-te e intensifica-te
vive e faz viver

Faz do teu coração porto seguro
onde os barcos não receiem acostar

Faz da tua alma protecção
da tua vida, uma chama
dos teus sentimentos, um vulcão

Ama... ama intensamente
Sempre

Para sempre...

SLL

Caravelas



Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.

Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!

Se eu sempre fui assim este Mar-Morto,
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram.

Caravelas doiradas a bailar...
Ai, quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!...

Florbela Espanca

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Quem Sou?



QUEM SOU 
De onde venho? 
Por baixo da pele me encontro 
Fora dela existo 
Alma e corpo 
Pensamentos e ações 
Humano e único 
Ou somatório de vários 
Sou rosto e voz 
Á procura de mim 

Quem sou eu afinal? 
Hoje sou o sítio que me considero 
No silêncio me invento 
Na multidão me consumo 
Consciência meu labirinto 
Mar oco de certas 
Dimensões que ultrapasso 
Durar para além dos momentos 
Neste cabimento dos vivos 

Mesmo andando às apalpadelas 
Estou preso a esta terra 
Mas ainda estranho a ela 
Sinto que por vezes 
Não caibo neste mundo 
Onde me quero encontrar 
Antes de assentar o pó!

Faze Araújo

Galáxias



Em entrega absoluta,
entrelaçam-se os corpos
quentes e húmidos
na doce carícia do luar
e das minhas mãos nas tuas...
Deixa-me encher o teu mundo de paz
sublime e extática.

Doce felicidade erótica
suspensa por um beijo, um afago, um olhar...
nesta plenitude,
onde a brisa nos levanta os cabelos
elevam-se os corações abertos ao infinito
onde não há tempo nem lugar.

Amor sem limites, sem fronteiras
onde a mais bela melodia
nos preenche os sentidos,
música em movimento
ao sabor das marés e das folhas das árvores
ao sabor do fogo que nos preenche
e nos expande...

Enche a minha noite com delícias
e palavras sussurradas.

Entra comigo nas chamas que dançam,
que libertam e purificam
e transformaremos cada faúlha numa centelha...

Quando dois corpos se unem
e se transmutam
na Unidade perfeita da comunhão de almas
nasce uma nova galáxia....

SLL

sábado, 23 de agosto de 2014

A Palavra Impossível


Deram-me o silêncio para eu guardar dentro de mim
A vida que não se troca por palavras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
As vozes que só em mim são verdadeiras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
A impossível palavra da verdade.

Deram-me o silêncio como uma palavra impossível,
Nua e clara como o fulgor duma lâmina invencível,
Para eu guardar dentro de mim,
Para eu ignorar dentro de mim
A única palavra sem disfarce -
A Palavra que nunca se profere.

Adolfo Casais Monteiro

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Lisboa Revisitada



NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!


Álvaro de Campos

Epifania



...A meio das escadas mudou de rumo e embrenhou-se pelo bosque, mais fresco e mais sombrio.
ansiava pelo contacto com a natureza, com a terra e as árvores
deitada no chão seco e forrado de folhagens, apreciava a sombra, de olhos fechados
e dos seus lábios saíram uma, duas, três palavras...
... uma sequência de frases murmuradas que nem ela sabia que queria dizer.
Abrindo os braços, ali permaneceu, simplesmente respirando, sentingo a terra ao longo do seu corpo e murmurando uma litania
até que uma luz radiosa e branca a cobre como um manto
Sente a energia fluir livemente por todos os poros da sua pele
e o fresco da sombra torna-se um calor intenso
não se move, deixa que flua
e o seu coração explode nesse calor branco e belo, em ondas concêntricas de energia emanada para o mundo
cálida e amorosa, quente e acalentadora,
enquanto os rostos de pessoas amadas sorringo, desfilam ante os seus olhos fechados
sem se aperceber bem, também lhes sorri.
Quando se dá conta, nota que seria impossível o brilho do sol atingi-la naquele ponto, daquele modo
e abre os olhos...
só tem tempo de agradecer aquele momento, que de súbito se desvanece, e a paisagem volta a ser o que era antes.
Levantando-se, ainda com um vago sorriso nos lábios, encaminha-se para a descida prometendo voltar em breve.

SLL

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Simplesmente Assim



Mãos que buscam no silêncio
lábios que se tocam, intermitentes...
sentidos que se ampliam e se projectam,
nos corpos orvalhados, incandescentes.

Olhos que vêem no escuro,
dedos se entrelaçam febrilmente.
laços que se envolvem, perduram...
corações que batem, permanentes.

Almas-afins, gémeas, irmãs
pulsando num mesmo diapasão,
dançando numa mesma melodia,
que envolve notas suaves de paixão.

Calma que invade os sentidos
enquanto que o amor flui livremente
e quando chega, por fim, o sorriso,
do céu chove doçura, suavemente....

SLL

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Afrodite



Uma deusa fez a sua morada
em labirintos místicos e rítmicos
nos subterrâneos mais profundos
do teu ser.

Com um simples estalar de dedos,
cantam os anjos um romance erótico
cujos poderes são únicos
e intransmissíveis.

A música da sua lira, encanta,
as suas palavras curam
e o seu silêncio conforta...

Mas quem será esta Mulher,
guardiã da poesia pura
em cuja história se mistura a dor e o Amor em partes iguais?

É preciso descer à terra para tocar os céus...
e ceder ao fascínio dos seus olhos
eternamente enamorados...

SLL

Labaredas


És tu... esta mulher.

Fogo que é, fogo que será sempre
labaredas purificadoras
ardendo de amor puro e límpido como cristal.

Deusa infinita que transcende os mundos
o espaço e o tempo,
que te transcendes a ti mesma
e nem sabes bem como...

és aquela que faz palpitar os corpos e os corações
e transformas o teu corpo em puro êxtase incondicional
pleno e absoluto

és aquela cujo coração arde em regeneração
e curas, e dás a vida, ressuscitas...

Além do tempo e do espaço
além de ti...
e de mim.

SLL